EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE
DIREITO DA ___VARA CÍVEL DO FORO CENTRAL DA CAPITAL/SP
XXXXXXXX, casado,
técnico, RG XXXXXXXXX, CPF/MF XXXXXX e XXXXXXXX, casada, professora, RG XXXXXXXX,
CPF XXXXXXXX, residentes e domiciliados à RUA XXXXXXX, XXXXX - APTO XXXXX – XXXXX
– BLOCO XX – XXXXX – SP, CEP.: XXXXX-XXX –, por seu advogado abaixo assinado,
procuração acostada, vem respeitosamente à presença de Vossa Excelência com
fulcro nos artigos 282 e seguintes do Código de Processo Civil, propor a
presente:
AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL c/c RESTITUIÇÃO
DE QUANTIAS PAGAS com pedido LIMINAR
em face de
XXXXXXXX, pessoa
jurídica, devidamente inscrita no CNPJ/MF sob nº XXXXXXXX, sediada na Rua XXXXXXXX,
nº XXXX, XXX, XXX, XXX/SP, CEP XXXX-XXX;
XXXXXXXX, pessoa
jurídica, devidamente inscrita no CNPJ/MF sob nº XXXXXXXX, sediada na Rua XXXXXXXX,
nº XXXX, XXX, XXX, XXX/SP, CEP XXXX-XXX; e
XXXXXXXX,
pessoa jurídica, devidamente inscrita no CNPJ/MF sob nº XXXXXXXX, sediada na
Rua XXXXXXXX, nº XXXX, XXX, XXX, XXX/SP, CEP XXXX-XXX, pelas razões de fato e
de direito a seguir expostas.
1. PRELIMINARMENTE
1.1. DO DESINTERESSE NA
AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO
Em cumprimento ao
previsto no §5º do artigo 334, do CPC, cumpre aos Autores
informar
que NÃO têm qualquer interesse na
designação de audiência de conciliação ou de mediação, nos termos do referido
dispositivo legal, razão pela qual apresenta objeção quanto a esse ato
processual.
Entretanto, em
caso de interesse na apresentação de eventual proposta de acordo,
nada
obsta que as Rés contatem a patrona dos Autores a qualquer momento, e havendo
entendimento a minuta de acordo será submetida à homologação judicial.
2. SÍNTESE DOS FATOS PARA A
COMPREENSÃO DA DEMANDA
Os Autores firmaram com a Ré XXXX, no
dia 19 de janeiro de 2022, o “Contrato de Compra e Venda”, tendo como objeto a
aquisição do lote nº 07, localizado na Quadra CZ, integrante do empreendimento
denominado “Ninho Verde II Eco Residence”, pelo valor certo e ajustado de R$ 124.144,81
(cento e vinte e quatro mil e cento e quarenta e quatro reais e oitenta e um
centavos sessenta e dois mil reais), não computado o valor da corretagem.
Do preço pactuado para aquisição do
lote, o Autor efetuou o pagamento de R$ 11.000,00
(onze mil reais) a título de parcelas de preço e entrada.
Excelência,
até o momento os
Autores pagaram o montante de R$ 36.524,94 (trinta e seis mil e quinhentos e
vinte e quatro reais e noventa e quatro centavos), referentes a
entrada/sinal e parcelas contratuais ajustadas, conforme documentos anexos.
No ato da compra,
foi imposta
pela Ré XXXX a contratação do contrato de
financiamento
junto à XXX XXXX XXX, não sendo
possibilitado aos Autores a livre contratação de qualquer outra empresa para a
concretização do negócio, senão única e exclusivamente aquela indicada pela
própria XXXX.
Através de uma simples análise de
ambos os contratos anexos a presente, é possível constatar que, além de
possuírem praticamente o mesmo layout, os dois contratos foram assinados na
mesma data e hora, bem como no mesmo local.
Ante a contratação do financiamento
acima citado, foi emitida a Cédula de Crédito Bancário de nº 307.8.212/01,
rapidamente após a emissão da cédula e celebração dos contratos, a Ré XXX
repassou os direitos creditórios para a terceira Requerida, a Securitizadora XXX XXXX, a qual passou a fazer as
cobranças mensais das parcelas do suposto financiamento do lote, desde o dia da
compra até os dias atuais.
Todo o
procedimento acima narrado não demonstra outra coisa senão a existência de GRUPO
ECONÔMICO entre as Rés, pois as empresas “SE VENDEM” conjuntamente, não sendo nem sequer efetuada qualquer
análise de crédito para a liberação da contratação de tão vultuosa quantia.
Dessa forma, seja
pela existência de grupo econômico, seja por ambas integrarem a cadeia de
fornecedores, todas as Rés deverão responder solidariamente aos termos da
demanda.
Pois bem, recentemente
os Autores entraram em contato com as Rés solicitando rescisão do contrato
pactuado, tentaram rescindir o contrato por via telefônica, e-mail WhatsApp e
por fim, notificando as rés.
Todavia, até a
presente data as Rés não resolveram o problema dos Autores de forma amigável,
restando as mesmas silentes quanto ao pedido de rescisão contratual.
Ainda assim,
apesar do expresso desejo dos Autores no desfazimento do Contrato
pactuado
e a consequente devolução dos valores pagos, dada a total ausência de resposta
positiva, visto que, absolutamente ninguém é obrigado a permanecer no negócio jurídico,
não restou nenhuma alternativa ao Autores, além de procurar o Poder Judiciário
para ter seus direitos exercidos.
Portanto, a
conduta das Rés em não rescindir o contrato, fere a legislação vigente,
isto
porque uma vez que as Rés, em evidente má-fé, se negam/se omitem em rescindir o
contrato entabulado entre as partes, faz com que os Autores se mantenham reféns
em um negócio que não têm interesse em permanecer. Tal atitude vai na contramão
do mais abalizado entendimento jurisprudencial e a legislação vigente.
Ora, Excelência,
para total estarrecimento dos Autores, verifica-se que nenhum dos contratos firmados possui cláusula resolutória, o que contraria
expressamente a determinação do artigo 26-A, inciso V, da Lei 6.766/79, bem
como OBRIGA
a busca do Poder Judiciário para solucionar a questão.
Nesse
passo, não há alternativa diferente do socorro jurisdicional, a fim da
decretação
de rescisão contratual, com a consequente RESTITUIÇÃO das partes ao “Status Quo Ante”, mediante a restituição
de 80% das quantias pagas, com o acréscimo de correção monetária desde cada
desembolso e de juros de mora de 1% ao mês desde o trânsito em julgado da ação.
Em que pese os Autores tenham seu
direito à rescisão protegido pelo CDC, bem como pela Nova Lei de Distrato,
nenhum dos contratos prevê a possibilidade de rescisão, não sendo claro quanto
se há algum valor a ser devidamente restituído aos Autores, o que poderá
acarretar, inclusive, a perda integral do montante pago, sendo um verdadeiro
absurdo.
Nesse ponto, é importante destacar
que, independentemente da roupagem que as Rés tentam passar ao contrato
firmado, o que houve, de fato, foi a assinatura pura e simples de um contrato
de compra e venda de imóvel, o qual se pretende rescindir. Os Autores não possuem
a intenção de financiar o imóvel, muito menos de celebrar qualquer outro
contrato, senão o de aquisição de um lote junto à Ré XXXX.
Impor aos Autores a
contratação de um financiamento imobiliário, sem que lhes sejam possibilitados,
ao menos
a busca própria, por outros meios, ou outras instituições bancárias, somente
demonstra a nítida atitude predatória das Rés, revelando, de maneira
extremamente cristalina, a hipossuficiência dos Consumidores, que devem ser
protegidos de tais abusos pelo Poder Judiciário.
Ora Excelência,
não é aceitável que o consumidor opte por rescindir o contrato e saia devedor,
ou mesmo perca a integralidade do montante pago, especialmente quando o pedido
de rescisão se deu em tão curto prazo de duração do contrato, não tendo os Autores
sequer desfrutado de qualquer benfeitoria do lote e condomínio.
Portanto, como
será devidamente elucidado nesta exordial, além de estar sendo privado do
direito expressamente garantido a rescisão, há ainda cláusulas abusivas que
autorizam, a princípio, a cobrança de multas, além de diversas retenções.
É óbvio que as
Rés, com o seu jogo torpe e a sua matemática desarrazoada, querem
levar
uma vantagem exagerada e enriquecer com o dinheiro dos Autores, não havendo
justificativa para essa conduta abusiva, imoral e ilegal!
Excelência, a Ré XXXX
é empresa que atua profissionalmente na comercialização de lotes e terrenos,
tendo em seu leque uma vasta opção de lotes, não sendo crível que tenha sofrido
tanto prejuízo com um contrato que, após a rescisão, terá o imóvel reintegrado
a seu patrimônio, podendo revendê-lo a outro comprador, por preço, inclusive,
superior àquele praticado com os Autores.
Ora, em outras
palavras, é vantajoso para as Rés terem clientes como os Autores, pois, após a
rescisão, permanecem com o imóvel, retendo integralmente o montante pago, ou
mesmo impondo multas abusivas, obtendo um gigantesco lucro por um contrato que
durou apenas poucos meses. Não há outra situação que melhor defina o termo ENRIQUECIMENTO
SEM CAUSA que não a que os Autores têm vivenciado perante as Rés.
Note-se, também,
que na medida em que não há qualquer previsão de rescisão contratual,
poder-se-ia concluir que os Autores devam permanecer indefinidamente vinculado
às Rés, o que contraria frontalmente o entendimento do E. TJSP e do C. STJ,
como será melhor exposto adiante.
Portanto é certo que se as Rés fossem efetivamente
empresas que atuam de acordo
as
Leis e os entendimentos pacificados pelas Cortes Superiores, e se houvesse a
preocupação e dedicação
com os consumidores, não os forçariam a ingressar com demanda judicial para
terem seus direitos reconhecidos.
Vale dizer, que as
Rés não terão nenhum prejuízo no
desfazimento do negócio,
tendo
em vista que poderão revender a
terceiros por um valor igual ou maior do que o fez para os Autores, vez
que, devido à crescente valorização imobiliária, apesar da “crise”, as
construtoras não têm baixado seus preços.
Ou seja, os fatos
demonstram uma manobra bem engendrada das Rés, no sentido de dificultar a
restituição dos valores pagos e, ainda, uma forma de tentar desesperadamente
reter o todos os valores pagos pelos Autores, trazendo a este um ônus
excessivo.
O contrato é completamente abusivo,
gera vantagem exagerada as Rés e afronta o Código de Defesa do Consumidor,
resultando no mais completo desequilíbrio contratual, de forma, que só o
judiciário pode restabelecer o equilíbrio perdido.
Diante do exposto,
cumpre esclarecer que a restituição das partes ao Status Quo Ante encontra-se protegida pelo ordenamento jurídico vigente, bem
como alinhado pelos precedentes do E. TJ/SP
e do próprio STJ, que melhor serão explorados adiante, não havendo
justificativa para a absurda postura das Rés, baseada em seu contrato leonino,
que lhes proporciona um evidente ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA, este que certamente
será combatido pelo Poder Judiciário.
Por fim, tendo em
vista que os Autores estão em juízo para discutir a RESCISÃO
contratual
com a recolocação das partes ao estado anterior à contratação, não há
razão para fazer qualquer pagamento
adicional às Rés. É uma questão de lógica!
Desta feita, é certo que os Autores
correm um sério risco de ter os seus nomes NEGATIVADOS, pois existem parcelas
vencidas e a vencer.
Por esta razão,
para que se impeçam os GRAVES prejuízos que poderão ser causados aos Autores,
em razão de eminente INSCRIÇÃO de seus nomes nos órgãos de proteção ao crédito,
se faz necessária a intervenção IMEDIATA do Poder Judiciário para que, seja sob
o manto da tutela antecipada ou com base no Poder de Cautela deste D. Juízo,
seja concedida medida liminar para: SUSPENDER a exigibilidade de TODAS as prestações advindas do contrato
entabulado entre as partes referente do lote nº 07, localizado na Quadra
CZ, integrante do empreendimento denominado “Ninho Verde II Eco Residence”, inclusive taxas e tributos, especialmente
o IPTU advindos dos lotes objeto de rescisão, ao menos até final julgamento
da ação, DETERMINANDO,
ainda, a rescisão do contrato, podendo as Rés dispor do lote.
Assim,
resta sobejamente demonstrado o problema a ser solucionado.
3. DO DIREITO
3.1. DA NECESSÁRIA APLICAÇÃO
DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
Inicialmente, nota-se que a relação
estabelecida entre as partes é governada pelo Código de Defesa do Consumidor
nos moldes da Lei nº 8.078/90, senão vejamos:
Art. 2º Consumidor é toda pessoa física ou jurídica
que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.
§ único. Equipara-se a consumidor a coletividade de
pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de
consumo.
Art. 3º Fornecedor é toda
pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem
como os entes despersonalizados, que desenvolvam atividade de produção,
montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação,
distribuição ou comercialização de produtos ou de prestação de serviços.
§ 1º
Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.
§ 2º Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado
de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária,
financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de
caráter trabalhista.
Vê-se, portanto, a
inequívoca aplicabilidade da legislação consumerista ao caso em tela, pois as
Rés vendem e financiam o empreendimento denominado “Riviera de Santa Cristina
XIII”, enquanto os Autores são verdadeiros consumidores do produto colocado à
disposição no mercado imobiliário.
Busca-se
ainda a aplicação do princípio constitucional da isonomia previsto no artigo 5º
da Constituição Federal buscando a interpretação mais favorável ao consumidor a
fim de se ter o equilíbrio contratual.
Art. 47 - As
cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao
consumidor.
Da
interpretação dos contratos, tratada no CDC, podemos extrair os seguintes
princípios
específicos da interpretação dos contratos:
1)
a interpretação é sempre mais favorável ao consumidor;
2)
deve-se atender mais à intenção das partes do que a literalidade da
manifestação de vontade (art. 85, CC);
3)
a cláusula geral de boa-fé reputa-se ínsita em toda a relação jurídica de
consumo, ainda que não conste expressamente do contrato;
4)
nos contratos de adesão as cláusulas ambíguas o contraditórias se fazem em
favor do aderente.
Com efeito, deve-se ainda observar a
regra do artigo 53 do Código de Defesa do Consumidor, que prevê retenção sobre
o valor total efetivamente pago, senão vejamos:
Art. 53 Nos contratos de compra e venda de móveis e
imóveis mediante pagamento em prestações, bem como nas alienações fiduciárias
em garantia, consideram-se nulas de pleno direito as cláusulas que estabeleçam
a perda total das prestações pagas em benefício do credor, em razão do
inadimplemento, pleitear a resolução do contrato e a retomada do produto
alienado.
§1º
(vetado)
§ 2º Nos contratos do sistema de consórcio de produtos
duráveis, a compensação ou a restituição das parcelas quitadas, na fora deste
artigo, terá descontada, além da vantagem econômica auferida com a fruição, os
prejuízos que o desistente ou inadimplente causar ao grupo. § 3º Os contratos
de que trata o caput deste artigo serão expressos em moeda corrente
nacional.
Dessa forma,
pode-se afirmar que a devolução da quantia paga deve ser em parcela única sob pena de colocar o consumidor em
desvantagem, aliás, assunto já sumulado.
Súmula nº 02 do STJ: A devolução das quantias pagas em
contrato de compromisso de compra e venda de imóvel deve ser feita de uma só
vez, não se sujeitando à forma de parcelamento prevista para a aquisição.
Ainda nesse
sentido, nota-se que referido contrato é caracterizado como contrato de adesão,
conforme reza o artigo 54 do Código de Defesa do Consumidor.
Art. 54 Contrato de
adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade
competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor do produto ou
serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu
conteúdo.
§ 1º A inserção de
cláusula no formulário não desfigura a natureza de adesão do contrato. § 2º Nos
contratos de adesão admite-se cláusula resolutória, desde que alternativa,
cabendo a escolha ao consumidor, ressalvando-se o disposto no § 2º do artigo
anterior.
§ 3º Os contratos de adesão escritos serão redigidos
em termos claros e com caracteres ostensivos e legíveis de modo a facilitar sua
compreensão pelo consumidor.
§ 4º As cláusulas que implicarem limitação de direito
do consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e
fácil compreensão.
Assim, resta claro
que a relação firmada entre as partes contratantes deve ser regida pelo Código
de Defesa do Consumidor.
3.2. DA BOA-FÉ OBJETIVA
O princípio da
boa-fé objetiva versa sobre um conjunto de deveres exigidos nos
negócios
jurídicos, mais explicitamente, nos contratos, destinado a pautar a conduta dos
contratantes, num silogismo de probidade, honestidade, lealdade e boa-fé.
Nas
palavras de Ruy Rosado Aguiar Júnior:
“a boa-fé se constitui numa fonte autônoma de deveres,
independentemente da vontade, e, por isso, a extensão e o conteúdo da relação
obrigacional já não se medem somente nela (vontade), e, sim, pelas
circunstâncias ou fatos referentes ao contrato, permitindo-se construir
objetivamente o regramento do negócio jurídico com a admissão de um dinamismo
que escapa ao controle das partes. A boa-fé significa a aceitação da
interferência de elementos externos na intimidade da relação obrigacional, com
poder limitador da autonomia contratual. O princípio da boa-fé significa que
todos devem guardar fidelidade à palavra dada e não frustrar ou abusar da
confiança que constitui a base imprescindível das relações humanas, sendo,
pois, mister que se proceda tal como se espera que o faça qualquer pessoa que
participe honesta e corretamente do tráfego jurídico. (Ruy Rosado Aguiar
Junior, Extinção dos contratos por incumprimento do devedor, p. 238)
O princípio da
boa-fé objetiva pode ser considerado como um elemento a mais na
interpretação
dos negócios jurídicos. Havendo divergência sobre o conteúdo das cláusulas
contratuais, e havendo necessidade de recorrer-se à interpretação como solução
da divergência, a interpretação segundo a boa-fé objetiva terá um papel
importante.
Dispõe o
artigo 422 do Código Civil:
Art. 422 Os contratantes são obrigados a guardar,
assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de
probidade e boa-fé.
Do que do presente
já consta, as Rés descumpriram com o
seu dever contratual
quando se
recusaram a aceitar a rescisão contratual e a devolução de quantia paga pelos
Autores.
3.3. DA
VENDA CASADA, DA CONCRETIZAÇÃO DO GRUPO ECONÔMICO E DA RESPOSABILIDADE
SOLIDÁRIA DAS RÉS
A
“venda casada” consiste em uma imposição feita pelo fornecedor ao consumidor,
consubstanciada na exigência de que para adquirir um produto ou contratar um
serviço, necessariamente o consumidor deverá adquirir outro, da mesma natureza
ou não.
Conforme art. 39 e
incisos do CDC, a prática abusiva mencionada ocorre onde a
compra
e efetiva utilização de um produto ou serviço está condicionada a outra, sem
dar ao consumidor a faculdade de obtê-lo ou não. Não nos faltam maneiras para
exemplificar como tal prática se dá no cotidiano da sociedade.
Assim
determina o Código de Defesa do Consumidor:
Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou
serviços, dentre outras práticas abusivas:
I - condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento
de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites
quantitativos;
A
proibição do modus operandi praticado
pelas Rés não decorre, portanto, de
entendimento
doutrinário ou jurisprudencial. Trata-se de vedação expressa da lei.
Como mencionado
anteriormente, quando da assinatura do contrato de compra e
venda,
aos Autores foi imposta a contratação da Ré XXX. Caso os Autores não desejassem
a contratação, o negócio não seria concretizado. Não houve nem sequer a possibilitação
de pesquisa junto ao mercado financeiro, a
opção por outras empresas que oferecessem condições diferentes daquelas IMPOSTAS pelas Rés.
Tratava-se,
portanto, de verdadeira conditio sine qua
non para a concretização do
negócio.
Quanto à reprovabilidade da venda casada,
eis o entendimento do E. TJSP:
Ementa: COMPRA E VENDA DE IMÓVEL.
REPARAÇÃO DE DANOS POR VÍCIOS
CONSTRUTIVOS.
TAXA SATI. Ação ajuizada pela adquirente em face das vendedoras pretendendo a
reparação dos danos morais decorrentes dos vícios construtivos existentes no
imóvel, bem como a restituição dos valores pagos a título de Taxa Sati.
Sentença de procedência. Apelo das rés. 1. Autora que não pleiteia a redibição
do negócio ou abatimento proporcional do preço, mas sim indenização pelos danos
morais decorrentes da diferença entre o projeto e o imóvel entregue. Prevalecem
sobre prazos estabelecidos contratualmente os prazos legais de garantia,
decadência e prescrição (art. 51, inciso I, do CDC). Aplicação do prazo
prescricional decenal do art. 205 do CC para vícios constatados dentro do prazo
de 5 anos do art. 618 do mesmo diploma. Aplicação adaptada ao Novo Código Civil
da Súmula nº 194 do E. STJ. Precedentes. 2. Imóvel que foi entregue de forma
diversa daquele apresentado quando da aquisição. Divergências relevantes entre
a publicidade veiculada pelas requeridas e o imóvel construído. Ausência de informação
clara e adequada ao consumidor. Colunas ("shafts") nos cantos das
paredes e encanamento exposto que causam transtornos e quebra de expectativa
que não podem ser considerados mero aborrecimento. Danos morais devidos.
Quantum fixado em patamar adequado. Precedentes deste E. TJSP. 3. Taxa cobrada
para fins de assessoria na contratação e registro do contrato de financiamento
a ser firmado para pagamento do preço. Divergência quanto ao enquadramento da
denominada taxa de despachante na expressão "atividade congênere"
mencionada no Tema 938 dos recursos repetitivos do E. STJ (REsp 1599511/SP). Ainda que
se adote a posição no sentido de que são
serviços não embutidos na própria compra do imóvel e passíveis de contratação em separado, o contexto da
contratação retira do consumidor a livre escolha e configura venda casada (art. 39, I, do
CDC). A contratação do serviço é apresentada no momento da assinatura dos instrumentos que envolvem a
compra e venda, em contexto em que a contratação
de tal serviço com a própria vendedora, e não com um terceiro, facilitaria todo
o procedimento necessário entre a
assinatura do compromisso e a efetiva transmissão da propriedade, inclusive no âmbito interno da incorporadora. Vendedora que
se aproveita da posição que ocupa e do
contexto da assinatura da venda para oferecer serviço que facilita seu negócio e ainda gera receita. Precedentes.
Cobrança indevida, devendo os valores pagos serem restituídos. 4. Recurso desprovido.
(TJSP
Apelação Cível 1012002-92.2020.8.26.0451. 7ª Câmara de Direito Privado. Rel.
Des. Mary Grün. Julgamento em 11/05/2021) (grifamos)
Ementa:
AÇÃO INDENIZATÓRIA – Contrato de promessa de compra e venda – Ação ajuizada
pelos compradores, fundada no inadimplemento da ré – Sentença que a julga
parcialmente procedente para condenar a ré ao pagamento do equivalente aos
juros de obra desembolsados pela Autora, após a entrega das chaves –
Inadimplemento da ré ao entregar o imóvel sem o "habite-se" –
Inconformismo da ré. PRAZO DE TOLERÂNCIA – Atraso na entrega da obra, para além
do prazo de tolerância de 180 dias previsto no contrato – Entrega das chaves,
dentro do prazo, mas sem o "habite-se" – Descumprimento contratual
que dá suporte ao ressarcimento dos prejuízos alegados – Entendimento alinhado
ao decidido pela Turma Especial de Direito Privado no IRDR nº
0023203-35.2016.8.26.0000 (Tema 1) – Sentença mantida. TAXA DE EVOLUÇÃO DA OBRA
– Juros de obra – Admissibilidade – Possibilidade de cobrança de juros
compensatórios dentro do prazo de entrega da obra, ou seja, referente a período
anterior à entrega das chaves – Tema 4, TJSP, IRDR nº 0023203-35.2016.8.26.0000
– Atraso na conclusão do empreendimento, contudo – Cobrança, no entanto,
referente ao período de mora da ré – Autores que fazem, jus, portanto, à
devolução do valor pago, desde a entrega das chaves, sem comprovação do
"habite-se", ou seja, de agosto de 2016 a julho de 2018 – Sentença
reformada para esse fim. DANO MORAL – Configuração – A demora injustificada na
entrega do imóvel, com o agravante de inúmeros defeitos construtivos, causa
dano moral, dada a frustração e angústia imposta ao comprador na espera pela
ocupação e fruição do bem adquirido – Indenização devida – Finalidade –
Reparação do sofrimento da vítima e, ao mesmo tempo, desestimular a prática do
fato, pelo ofensor – INDENIZAÇÃO – Valor – Arbitramento que deve se dar com
observância dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, evitando o
enriquecimento sem causa do ofendido, ou provocando injusto desfalque do
patrimônio do ofensor – Arbitramento em R$ 15.000,00 – Valor que atende aos
critérios mencionados – Juros a partir da citação e correção monetária a contar
deste julgamento – Sentença reformada. TAXA SERVIÇO DE DESPACHANTE – Taxa de
administração e SATI, dita pela vendedora de serviço de despachante – Pretensão
dos compradores à restituição de valores pagos a esse título – Aditivo
contratual para prestação de serviços assinados pelo comprador, para auxílio na
obtenção de documentação necessária ao financiamento – Contrato que estipula
claramente os serviços oferecidos, o preço e a forma de pagamento – Imposição,
no entanto, de que, convocada os compradores para, em trinta dias, comparecer e
fornecer os documentos necessários, caso contrário podendo o contrato ser
rescindido – Contratação não ofertada, mas imposta de
forma onerosa, vinculada ao contrato de compra e venda, a
configurar verdadeira venda casada, assemelhada à chamada
taxa SATI, disfarçada de taxa de despachante – Cobrança indevida – Entendimento
firmado pelo Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso repetitivo –
Sentença que determina a restituição dessas taxas, mantida. Apelação da ré não
provida, provida a da Autora, para julgar a ação totalmente procedente.
(TJSP
Apelação Cível 1008954-68.2017.8.26.0019. 10ª Câmara de Direito Privado. Rel.
Des. João Carlos Saletti. Julgamento em 30/04/2021) (grifamos)
SEGURO
– Tese firmada no julgamento do REsp 1.639.259/SP, sob o rito dos recursos
repetitivos, que sedimentou o entendimento de que "Nos
contratos bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a
contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela
indicada" –
Imposição, ao consumidor, de contratação de seguro com seguradora indicada pela
instituição financeira fornecedora do crédito objeto do financiamento –
Hipótese de venda casada – Abusividade configurada
(TJSP
Apelação Cível 1000082-35.2016.8.26.0040. 24ª Câmara de Direito Privado. Rel.
Des. Plinio Novaes de Andrade Junior. Julgamento em 18/06/2021) (grifamos)
Portanto, resta
demonstrada a ocorrência de venda casada pelas Rés, pois aos Autores não foi aberta a possibilidade de
escolha sobre com qual instituição financeira proceder a eventual
financiamento.
Logo se vê que as
empresas Rés são pertencentes a um mesmo grupo econômico e, por isso, devem
responder solidariamente aos termos da demanda. Ora, se no momento da venda, a
única opção aos Autores consumidores para contratação do financiamento é a Ré XXX,
logo, pela teoria da aparência, ambas as Rés pertencem a um grupo
econômico, onde uma oferece os imóveis à venda e outra realiza o
financiamento.
Tão facilitadas
são as condições de contratação que, repita-se, para um contrato de tão elevado
valor, nenhum documento
para a análise e aprovação de crédito foi exigida dos Autores,
bastando tão somente as declarações contratuais e a assinatura dos
contratantes.
Nas lições
de Victor Frederico Kümpel:
“a
aparência outorgou legitimidade a uma pessoa, conferindo-lhe direitos, com
relevância econômica, pela absoluta impossibilidade de cognição da realidade
jurídica que o levou a realizar o negócio jurídico. A aparência não incide e
não poderia incidir sobre a avaliação substancial dos interesses em jogo. É
apenas um instrumento a serviço de uma das partes na relação jurídica, para
proteger até a segurança do sistema jurídico. [...] Conforme está sendo
mostrada, a teoria da aparência jurídica é um instrumento hábil para proteger
os terceiros de boa-fé, evitando insegurança jurídica em negócios que, objetiva
e subjetivamente, crêem ser suportes jurídicos aptos a produzir efeitos
permanentes. Ante a publicidade gerada e a
confiança legítima, imputadas na relação, é que o sistema jurídico convalida uma relação originária nula ou até
inexistente para fins de proteção desse terceiro de boa-fé” (KÜMPEL, Vitor Frederico. Teoria da aparência no Código
Civil de 2002. São Paulo: Método, 2007, p. 58-59) (grifamos)
A adoção da teoria
da aparência nada mais é que um desdobramento da aplicação do princípio geral
da boa-fé objetiva. Afinal, privilegia-se a aparência em detrimento da
realidade, com a finalidade de preservar o terceiro de boa-fé.
Segundo o
ensina Judith Martins-Costa:
“agir
segundo a boa-fé objetiva concretiza as exigências de probidade, correção e
comportamento leal hábeis a viabilizar um
adequado tráfico negocial, consideradas a finalidade e a utilidade do negócio em vista do qual se vinculam, vincularam,
ou cogitaram vincular-se, bem como o específico
campo de atuação em que situada a relação obrigacional.”
(MARTINS-COSTA, Judith.
A
boa-fé no direito privado: critérios para sua aplicação. 2ª ed., São Paulo:
Saraiva Educação, 2018, p. 43) (grifamos)
Nessa senda, não
se afigurava razoável exigir que os Autores duvidassem da lisura do
procedimento adotado, tendo por base os elementos fáticos descritos, à luz das
teorias da confiança e da aparência, que legitimaram comportamento concludente
e justa expectativa correlata.
Ainda que não se
reconheça a responsabilidade solidária pela formação do grupo
econômico
diante da teoria da aparência, é fato incontestável que ambas as empresas
integram a cadeia de fornecimento, e, também por tal motivo, devem responder
solidariamente quanto aos termos da presente demanda, nos termos do artigo 7º,
parágrafo único do CDC, pelo qual “Tendo mais de um autor a ofensa, todos
responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo.”
3.4. DA INEXISTENCIA DE CLÁUSULA RESOLUTÓRIA – EVIDENTE OFENSA AO
ARTIGO 26-A, INCISO V DA LEI 6.766/79
O inciso V, do
art. 26-A da Lei 6.766/79 dispõe que não apenas os contratos de compromisso ou
promessa de compra e venda, mas também os contratos de compra e venda de lotes
devem conter regras que disciplinem “as consequências do desfazimento do
contrato”, ou seja, devem ter, obrigatoriamente uma cláusula resolutória:
Art. 26-A. Os contratos
de compra e venda, cessão ou promessa de cessão de loteamento devem ser
iniciados por quadro-resumo, que deverá conter, além das indicações constantes
do art. 26 desta Lei: (Incluído pela Lei nº 13.786, de 2018)
(...)
V - as consequências do desfazimento do contrato, seja
mediante distrato, seja por meio de resolução contratual motivada por
inadimplemento de obrigação do adquirente ou do loteador, com destaque
negritado para as penalidades aplicáveis e para os prazos para devolução de
valores ao adquirente; (Incluído pela Lei nº 13.786, de 2018)
A necessidade de
cláusula resolutória com as penalidades aplicáveis é tão imperiosa que o §1° do
mesmo artigo dispõe que se a ausência destas regras não for sanada
“caracterizará justa causa para rescisão contratual por parte do adquirente”.
Deste modo,
observa-se que a Ré XXXX descumpriu o mandamento previsto no inciso V do art.
26-A da Lei 6.766/79, ao deixar de incluir cláusula resolutória e as
penalidades decorrentes da rescisão no Contrato Particular de Compromisso de
Compra e Venda.
Cumpre ainda destacar que, conforme se
verá adiante, não se trata de contrato
definitivo
de compra e venda, mas de compromisso de compra e venda, já que se trata de
contrato particular e a legislação civil expressamente dispõe que o contrato
definitivo de compra e venda de imóveis de valor superior a trinta
salários-mínimos, para que tenha validade, deve ser feito por escritura pública
(art. 108 e art. 104, III do Código Civil).
3.5. DO CONTRATO DE
COMPROMISSO EM OPOSIÇÃO AO CONTRATO DEFINITIVO
Faz-se necessário
destacar que o Contrato celebrado entre as partes NÃO é um
contrato
definitivo de compra e venda, mas sim um contrato particular de promessa ou
compromisso de compra e venda.
Trata-se de contrato
particular preliminar e não escritura pública definitiva, fato que, por
si só, afasta a tese das Rés de que o contrato celebrado tem caráter
definitivo.
Neste sentido o
artigo 108 do Código Civil é claro ao dispor que, a validade dos negócios
jurídicos de venda de imóveis de valor superior a 30 salários mínimos depende
da formalização do negócio por meio de escritura pública:
Art. 108: Não dispondo a lei em contrário, a escritura
pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição,
transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor
superior a trinta vezes o maior salário-mínimo vigente no País.
Portanto, tendo o
lote valor superior a 30 vezes o salário-mínimo vigente no país,
tem-se
que o contrato particular de compra e venda juntado a presente, se trata na
verdade de um contrato de promessa ou de compromisso de compra e venda e não de
um contrato definitivo.
Ademais, a própria
Lei estabelece de forma clara as duas ÚNICAS situações em que um contrato
particular se torna definitivo, e são elas:
1) Aquisição de imóvel pelo
SFH com garantia de hipoteca nos termos do art.
61, §5° da
Lei 4.380/64.
2) Aquisição de imóvel com
alienação fiduciária de bem imóvel nos termos do art. 38 da Lei 9.514/97.
Deste modo, uma
vez não verificadas as situações acima descritas, não resta dúvida alguma de
que o contrato firmado entre as partes não é um contrato definitivo, sendo
passível de rescisão contratual.
3.6. DO DIREITO LÍQUIDO E CERTO A RESCISÃO CONTRATUAL COM A DEVIDA
RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS
Conforme aduzido,
os Autores tentaram uma composição amigável com as Rés antes de provocar o
Judiciário, a fim de receber os valores desembolsados em razão da rescisão do
Contrato de Compra e Venda, todavia, tais tentativas restaram frustradas.
Não obstante,
ressalta-se que os pleitos dos Autores estão totalmente agasalhados pela
legislação, inclusive com pronunciamento dos Tribunais em casos análogos, senão
vejamos:
Compromisso de venda e compra. Dissolução do contrato
por iniciativa da adquirente. Circunstância que não impede a devolução das
parcelas pagas, sob pena de ofensa ao art. 53 do CDC. Retenção
corretamente autorizada em 20% dos valores pagos.
Juros de mora que devem mesmo incidir desde o
trânsito em julgado. Sentença mantida. Recurso desprovido.
(TJSP; Apelação Cível 1006906-73.2019.8.26.0664;
Relator (a): Claudio Godoy; Órgão Julgador: 1ª Câmara de Direito Privado; Foro
de Votuporanga - 2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 03/02/2020; Data de
Registro: 03/02/2020). Grifo
próprio.
APELAÇÃO
- COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA –
RESOLUÇÃO MOTIVADA PELO ADQUIRENTE – DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS, COM RETENÇÃO
– PARCIAL PROCEDÊNCIA – INCONFORMISMO DA RÉ – ACOLHIMENTO EM PARTE –
Abusividade da cláusula contratual que prevê descontos excessivos para o caso
de rescisão contratual por culpa do adquirente - Caso concreto que demonstra ser razoável a retenção no percentual de
20% dos valores pagos a título de indenização pelas despesas geradas,
segundo entendimento do STJ e precedentes desta C. Câmara – Taxa
de ocupação - Inadmissibilidade – Incabível indenização quando se trata de lote
de terreno sem edificação - DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO. (TJSP;
Apelação Cível 1000365-12.2019.8.26.0474; Relator (a): Alexandre Coelho;
Órgão Julgador: 8ª Câmara de Direito Privado; Foro de Potirendaba - Vara Única;
Data do Julgamento: 31/01/2020; Data de Registro: 31/01/2020). Grifo próprio.
Sendo assim, é
certo que as Súmulas 1, 2 e 3 do E. TJ/SP permitem ao promissário-
comprador,
mesmo inadimplente, RESCINDIR o compromisso de venda e compra e receber de
volta parte das quantias quitadas ao comprador; senão vejamos:
Súmula 1: O Compromissário comprador de imóvel, mesmo
inadimplente, pode pedir a rescisão do contrato e reaver as quantias pagas,
admitida a compensação com gastos próprios de administração e propaganda feitos
pelo compromissário vendedor, assim como com o valor que se arbitrar pelo tempo
de ocupação do bem.
Súmula 2: A devolução das quantias pagas em contrato
de compromisso de compra e venda de imóvel deve ser feita de uma só vez, não se
sujeitando à forma de parcelamento prevista para a aquisição.
Súmula 3: Reconhecido que o compromissário comprador
tem direito à devolução das parcelas pagas por conta do preço, as partes
deverão ser repostas ao estado anterior, independentemente de reconvenção.
Como se
pode observar, nos termos da SÚMULA 1 do TJ/SP, o promissário
comprador,
mesmo inadimplente, poderá requerer a
rescisão da promessa de compra e venda, admitindo-se
a retenção de valores apenas para compensar os gastos administrativos e de publicidade da Loteadora.
O direito do
promissário comprador de rescindir a promessa de compra e venda
também
fora reconhecido pela SÚMULA 543 DO STJ,
que dispõe que o comprador tem direito a imediata restituição das parcelas
pagas, ainda que ele tenha dado causa à rescisão:
Súmula 543 - Na hipótese de resolução de contrato de
promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do
Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo
promitente comprador -integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente
vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu
causa ao desfazimento.
(Súmula 543, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em
26/08/2015, DJe 31/08/2015)
Portanto,
repita-se, mesmo nos casos em que o adquirente esteja inadimplente, este fará
jus à rescisão do contrato, devendo as partes serem repostas ao status anterior à celebração do
contrato.
Considerando a
conduta perpetrada pelas Rés, os Autores
PRETENDEM ser repostos ao estado em que estavam antes da celebração da avença
em discussão (restabelecimento da parte ao STATUS QUO ANTE), mediante a restituição de 80% das quantias pagas por
esta aquisição até o último centavo destinado às Rés.
Isso significa
dizer que os valores quitados pelos compromissários compradores deverão ser
restituídos, À VISTA, devidamente atualizados desde cada desembolso e
acrescido dos respectivos juros de mora,
e tudo pago em uma única parcela.
Desta forma, de rigor o decreto
judicial de rescisão do “Contrato de Compra e Venda”, referente a aquisição do lote
nº 07, localizado na Quadra CZ, integrante do empreendimento denominado “Ninho
Verde II Eco Residence”, com a
consequente condenação das Rés na restituição de 80% dos valores pagos pelos
Autores, a título de parcelas contratuais e entrada, a ser corrigido
monetariamente a partir do desembolso de cada pagamento, além da incidência de
juros legais de 1% (um por cento) ao mês a partir do transito em julgado da
ação, até a data do efetivo pagamento.
4. DA
CONCESSÃO DE TUTELA DE URGÊNCIA – Art. 300 e ss, do CPC
4.1. DA
NECESSÁRIA ABSTENÇÃO DE INCLUSÃO DO NOME DOS AUTORES NOS CADASTROS DE
RESTRIÇÕES AO CRÉDITO E DA SUSPENSÃO E INEXIGIBILIDADE DE VALORES RELATIVOS À
COMPRA E VENDA DO IMÓVEL OBJETO DA RESCISÃO
Uma vez que os
Autores optaram por rescindir o contrato e estão em juízo para discutir o valor
a receber, é evidente que NÃO
justifica a realização de qualquer pagamento adicional às Rés.
O grande problema
e o maior medo dos Autores é o risco que corre de terem seus nomes negativados,
uma vez que, há parcelas a vencer, em razão de não ter mais condições de
cumprir com suas obrigações e manter o negócio jurídico pactuado.
Em razão disso, é
certo que as Rés podem taxar os Autores de INADIMPLENTES
e passar a realizar a cobrança do saldo devedor, inserindo, inclusive o
nome dos Autores nos cadastros de restrições ao crédito.
Ora Excelência,
por uma questão de lógica, se os Autores estão em juízo para que seja declarada
a RESCISÃO DO CONTRATO e determinada a DEVOLUÇÃO dos valores já pagos, nenhum
pagamento adicional deverá ou poderá ser realizado as Rés, pois isso não faria
o menor sentido.
No entanto, os
Autores não podem ficar sujeitos ao alvedrio das Rés que, a julgar pelos
comportamentos pretéritos, poderão negativar o nome dos Autores, o que seria
um verdadeiro absurdo, pois as Rés se
negaram a realizar o distrato do contrato pactuado, de forma justa, e restituir
os valores devidamente quitados de forma condizente!!
Desta forma,
agora, os Autores necessitam de um provimento jurisdicional para impedir que
seja vitimado de coação moral que certamente irá acontecer, nos termos do art.
300 e seguintes, do CPC, vejamos:
Art. 300 - A tutela de urgência será concedida quando
houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano
ou o risco ao resultado útil do processo.
§1º - Para a concessão da tutela de urgência, o juiz
pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir
os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada
se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la. §2º - A tutela
de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia. §3º -
A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver
perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.
Desta forma, requerem os Autores a
este D. Juízo que seja concedida medida liminar para SUSPENDER a exigibilidade de TODAS as prestações advindas do contrato
entabulado entre as partes referente ao lote
nº 07, localizado na Quadra CZ, integrante do empreendimento denominado “Ninho
Verde II Eco Residence”, DETERMINANDO
que as Rés se abstenham de negativar os nomes dos Autores nos órgãos de
proteção ao crédito, ao menos até final julgamento da ação, DECLARANDO, ainda, a prévia rescisão do
contrato, podendo as Rés disporem do Lote, sem a oitiva da parte contrária,
ao menos até final julgamento da ação.
5. DOS PEDIDOS
Diante de todo o
exposto, requerem os Autores que se digne Vossa Excelência:
1.
Seja imediatamente
concedida a TUTELA DE URGÊNCIA, sem
a oitiva da parte contrária, para que, seja sob o manto da tutela antecipada, à
luz do artigo 300 e ss, do CPC, sejam determinadas as seguintes providências às
Rés:
• SUSPENDAM A EXIGIBILIDADE
DOS VALORES DO CONTRATO, INCLUSIVE DAS DEMAIS DESPESAS ADVINDAS DO LOTE E DO
IPTU, determinado que as Rés arquem com o pagamento de todas as despesas,
haja vista a rescisão contratual que se pretende, sob pena de multa diária a
ser prudentemente arbitrada por este D. Juízo;
• Determine
as Rés que SE ABSTENHAM DE NEGATIVAR O
NOME DOS AUTORES perante os órgãos de proteção ao crédito, em razão do não
pagamento das parcelas contratuais advindas do lote sob pena de pagamento de
multa diária no valor a ser arbitrado por este Juízo;
• Seja
declarada a rescisão do contrato, podendo as Rés disporem do imóvel desde o
conhecimento da decisão que deferiu a tutela.
2.
Informam os Autores não
terem interesse na designação da Audiência de Conciliação ou Mediação, conforme
previsto no art. 319, do CPC;
3.
Requer a juntada das
inclusas guias de custas devidamente recolhidas;
4.
Requer a citação das Rés nos endereços
declinados na presente, POR CARTA DIGITAL UNIPAGINADA, conforme comunicados CG
165/2014 e SPI 306/2013, para, querendo, oferecer defesa, sob pena dos efeitos
da revelia, e, ao final, seja a presente demanda julgada
TOTALMENTE PROCEDENTE a presente demanda para;
a.
Reconhecer a
responsabilidade solidária das Rés, nos termos expostos;
b.
Confirmar por sentença a
liminar ora pleiteada para o fim de declarar a inexigibilidade das parcelas do
contrato e impossibilidade de negativação do nome dos Autores, bem como para
que assuma todas as despesas com o imóvel, além da rescisão contratual;
c.
Que seja determinada a
inversão do ônus da prova nos termos do artigo 6º, inciso
VIII da Lei
8.078/90, a fim de que os Autores tenham facilitadas a defesa de seus direitos;
d.
Requer sejam as Rés
condenadas a restituir aos Autores, em parcela única, o equivalente a 80%
(oitenta por cento) dos valores desembolsados por ele a título de entrada e
parcelas do terreno, que serão devidamente apurados em fase de liquidação de
sentença, devidamente corrigidos desde cada desembolso e acrescidos de juros
legais desde o trânsito em julgado até o efetivo pagamento, com a consequente
declaração de rescisão do Contrato de Promessa de Compra e Venda firmado para
aquisição do lote nº 07, localizado na Quadra CZ, integrante do
empreendimento denominado “Ninho Verde II Eco Residence”, direito assegurado não apenas pelo
CDC, mas também pelas súmulas 1, 2 e 3 do E. TJSP e 543 do STJ;
e.
Condenar as Rés ao
pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios a serem arbitrados por este d. juízo, bem como, pelo PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE,
deve ser aplicada às Rés a sucumbência tendo em vista que se negaram a realizar
o distrato do contrato de forma condizente com a legislação, não havendo outra
forma dos Autores fazê-lo senão com a propositura da presente.
Por
fim, protesta provar o alegado, por todos os meios de direito admitidos em
especial, prova
documental e depoimento da requerida.
Atribui-se
à causa o valor de R$ 29.219,95
(vinte e nove mil e duzentos e dezenove reais e noventa e cinco centavos), correspondente à cominação máxima
prevista no item “d” acima, em consonância com o artigo 292, II, do Código de
Processo Civil, que alterou a legislação anterior para atribuir às causas que
versem sobre a rescisão contratual, o valor do BENEFÍCIO ECONÔMICO almejado na
demanda.
Art. 292. O valor da causa constará da petição inicial
ou da reconvenção e será: II - na ação que tiver por objeto a existência, a
validade, o cumprimento, a modificação, a resolução, a resilição ou a rescisão
de ato jurídico, o valor do ato ou o de sua
parte controvertida;
Tal alteração vem em consonância com
a orientação jurisprudencial do nosso Tribunal, senão vejamos:
Ementa:
Agravo de Instrumento. Valor da causa.
Autores que pretendem obter a restituição de percentual dos valores pagos em
razão do compromisso de compra e venda rescindendo. Juízo que determinou a alteração do valor da causa, para equivaler ao
valor do contrato. Aplicação do art. 292, II, do CPC. Valor da causa
que deverá ser atribuído de acordo com o benefício patrimonial pretendido, o que
se coaduna, neste caso, com a melhor interpretação do comando legal no sentido
de que deve
corresponder ao valor "de sua parte controvertida". Agravo provido.
(Agravo de
Instrumento 2055999-74.2018.8.26.0000. 7ª Câmara de Direito Privado. Relatora
Desembargadora
MARIA DE LOURDES LOPEZ GIL. Julgamento em 26/11/2018) (grifamos)
Ementa:
Agravo de instrumento – Ação de rescisão de compromisso de compra e venda c.c.
restituição de valores – Insurgência em relação as decisões que corrigiram o
valor atribuído à causa, (para o valor do contrato a ser rescindido) – Valor
atribuído à causa que, no caso de rescisão promovida pelos compradores, deve corresponder
ao valor do ressarcimento pretendido, já que é o proveito econômico perseguido –
Quantia que reflete a expressão econômica da causa - Previsão expressa
no art. 292, II do CPC – Precedentes jurisprudenciais, inclusive desta Câmara
- Decisão modificada para se manter o valor originalmente atribuído à causa –
Recurso provido. (Agravo de
Instrumento 2217010-15.2018.8.26.0000. 8ª Câmara de Direito Privado. Relator
Desembargador SILVÉRIO DA SILVA. Julgamento em 21/11/2018) (grifamos).
Por fim, requerem que todas as
intimações sejam realizadas em nome da advogada Dra. XXXX XXXX XXXX,
inscrito na OAB/SP sob nº XXX.XXX, telefone de contato XX XXXXX-XXXX, com
endereço eletrônico XXXXXXXXXXX, sob pena de nulidade, nos termos legais.
Nestes Termos
Pede Deferimento.
São Paulo, XX de XXXXX de 20XX.
Dra. XXXXX XXXXXX
(OAB/SP) sob o nº. XXX.XXX
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