quarta-feira, 17 de julho de 2024

PETIÇÃO INICIAL AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL c/c RESTITUIÇÃO DE QUANTIAS PAGAS com pedido LIMINAR - EMPREITEIRA E BANCO

  

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ___VARA CÍVEL DO FORO CENTRAL DA CAPITAL/SP

 

 

 

 

 

XXXXXXXX, casado, técnico, RG XXXXXXXXX, CPF/MF XXXXXX e XXXXXXXX, casada, professora, RG XXXXXXXX, CPF XXXXXXXX, residentes e domiciliados à RUA XXXXXXX, XXXXX - APTO XXXXX – XXXXX – BLOCO XX – XXXXX – SP, CEP.: XXXXX-XXX –, por seu advogado abaixo assinado, procuração acostada, vem respeitosamente à presença de Vossa Excelência com fulcro nos artigos 282 e seguintes do Código de Processo Civil, propor a presente:

 

AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL c/c RESTITUIÇÃO

DE QUANTIAS PAGAS com pedido LIMINAR

 

em face de 

 

XXXXXXXX, pessoa jurídica, devidamente inscrita no CNPJ/MF sob nº XXXXXXXX, sediada na Rua XXXXXXXX, nº XXXX, XXX, XXX, XXX/SP, CEP XXXX-XXX;

 

XXXXXXXX, pessoa jurídica, devidamente inscrita no CNPJ/MF sob nº XXXXXXXX, sediada na Rua XXXXXXXX, nº XXXX, XXX, XXX, XXX/SP, CEP XXXX-XXX; e

 

XXXXXXXX, pessoa jurídica, devidamente inscrita no CNPJ/MF sob nº XXXXXXXX, sediada na Rua XXXXXXXX, nº XXXX, XXX, XXX, XXX/SP, CEP XXXX-XXX, pelas razões de fato e de direito a seguir expostas.

 

1. PRELIMINARMENTE

1.1. DO DESINTERESSE NA AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO

 

Em cumprimento ao previsto no §5º do artigo 334, do CPC, cumpre aos Autores

informar que NÃO têm qualquer interesse na designação de audiência de conciliação ou de mediação, nos termos do referido dispositivo legal, razão pela qual apresenta objeção quanto a esse ato processual. 

 

Entretanto, em caso de interesse na apresentação de eventual proposta de acordo,

nada obsta que as Rés contatem a patrona dos Autores a qualquer momento, e havendo entendimento a minuta de acordo será submetida à homologação judicial.

 

2. SÍNTESE DOS FATOS PARA A COMPREENSÃO DA DEMANDA

 

Os Autores firmaram com a Ré XXXX, no dia 19 de janeiro de 2022, o “Contrato de Compra e Venda”, tendo como objeto a aquisição do lote nº 07, localizado na Quadra CZ, integrante do empreendimento denominado “Ninho Verde II Eco Residence”, pelo valor certo e ajustado de R$ 124.144,81 (cento e vinte e quatro mil e cento e quarenta e quatro reais e oitenta e um centavos sessenta e dois mil reais), não computado o valor da corretagem.

 

Do preço pactuado para aquisição do lote, o Autor efetuou o pagamento de R$ 11.000,00 (onze mil reais) a título de parcelas de preço e entrada.

 

Excelência, até o momento os Autores pagaram o montante de R$ 36.524,94 (trinta e seis mil e quinhentos e vinte e quatro reais e noventa e quatro centavos), referentes a entrada/sinal e parcelas contratuais ajustadas, conforme documentos anexos.

 

No ato da compra, foi imposta pela Ré XXXX a contratação do contrato de

financiamento junto à XXX XXXX XXX, não sendo possibilitado aos Autores a livre contratação de qualquer outra empresa para a concretização do negócio, senão única e exclusivamente aquela indicada pela própria XXXX.

 

Através de uma simples análise de ambos os contratos anexos a presente, é possível constatar que, além de possuírem praticamente o mesmo layout, os dois contratos foram assinados na mesma data e hora, bem como no mesmo local. 

 

Ante a contratação do financiamento acima citado, foi emitida a Cédula de Crédito Bancário de nº 307.8.212/01, rapidamente após a emissão da cédula e celebração dos contratos, a Ré XXX repassou os direitos creditórios para a terceira Requerida, a Securitizadora XXX XXXX, a qual passou a fazer as cobranças mensais das parcelas do suposto financiamento do lote, desde o dia da compra até os dias atuais.

 

Todo o procedimento acima narrado não demonstra outra coisa senão a existência de GRUPO ECONÔMICO entre as Rés, pois as empresas “SE VENDEM” conjuntamente, não sendo nem sequer efetuada qualquer análise de crédito para a liberação da contratação de tão vultuosa quantia.

 

Dessa forma, seja pela existência de grupo econômico, seja por ambas integrarem a cadeia de fornecedores, todas as Rés deverão responder solidariamente aos termos da demanda.

 

Pois bem, recentemente os Autores entraram em contato com as Rés solicitando rescisão do contrato pactuado, tentaram rescindir o contrato por via telefônica, e-mail WhatsApp e por fim, notificando as rés.

 

Todavia, até a presente data as Rés não resolveram o problema dos Autores de forma amigável, restando as mesmas silentes quanto ao pedido de rescisão contratual.

 

Ainda assim, apesar do expresso desejo dos Autores no desfazimento do Contrato

pactuado e a consequente devolução dos valores pagos, dada a total ausência de resposta positiva, visto que, absolutamente ninguém é obrigado a permanecer no negócio jurídico, não restou nenhuma alternativa ao Autores, além de procurar o Poder Judiciário para ter seus direitos exercidos.

 

Portanto, a conduta das Rés em não rescindir o contrato, fere a legislação vigente,

isto porque uma vez que as Rés, em evidente má-fé, se negam/se omitem em rescindir o contrato entabulado entre as partes, faz com que os Autores se mantenham reféns em um negócio que não têm interesse em permanecer. Tal atitude vai na contramão do mais abalizado entendimento jurisprudencial e a legislação vigente. 

 

Ora, Excelência, para total estarrecimento dos Autores, verifica-se que nenhum dos contratos firmados possui cláusula resolutória, o que contraria expressamente a determinação do artigo 26-A, inciso V, da Lei 6.766/79, bem como OBRIGA a busca do Poder Judiciário para solucionar a questão.

 

Nesse passo, não há alternativa diferente do socorro jurisdicional, a fim da

decretação de rescisão contratual, com a consequente RESTITUIÇÃO das partes ao “Status Quo Ante”, mediante a restituição de 80% das quantias pagas, com o acréscimo de correção monetária desde cada desembolso e de juros de mora de 1% ao mês desde o trânsito em julgado da ação.

 

Em que pese os Autores tenham seu direito à rescisão protegido pelo CDC, bem como pela Nova Lei de Distrato, nenhum dos contratos prevê a possibilidade de rescisão, não sendo claro quanto se há algum valor a ser devidamente restituído aos Autores, o que poderá acarretar, inclusive, a perda integral do montante pago, sendo um verdadeiro absurdo.

 

Nesse ponto, é importante destacar que, independentemente da roupagem que as Rés tentam passar ao contrato firmado, o que houve, de fato, foi a assinatura pura e simples de um contrato de compra e venda de imóvel, o qual se pretende rescindir. Os Autores não possuem a intenção de financiar o imóvel, muito menos de celebrar qualquer outro contrato, senão o de aquisição de um lote junto à Ré XXXX.

 

Impor aos Autores a contratação de um financiamento imobiliário, sem que lhes sejam possibilitados, ao menos a busca própria, por outros meios, ou outras instituições bancárias, somente demonstra a nítida atitude predatória das Rés, revelando, de maneira extremamente cristalina, a hipossuficiência dos Consumidores, que devem ser protegidos de tais abusos pelo Poder Judiciário.

 

Ora Excelência, não é aceitável que o consumidor opte por rescindir o contrato e saia devedor, ou mesmo perca a integralidade do montante pago, especialmente quando o pedido de rescisão se deu em tão curto prazo de duração do contrato, não tendo os Autores sequer desfrutado de qualquer benfeitoria do lote e condomínio.

 

Portanto, como será devidamente elucidado nesta exordial, além de estar sendo privado do direito expressamente garantido a rescisão, há ainda cláusulas abusivas que autorizam, a princípio, a cobrança de multas, além de diversas retenções. 

 

É óbvio que as Rés, com o seu jogo torpe e a sua matemática desarrazoada, querem

levar uma vantagem exagerada e enriquecer com o dinheiro dos Autores, não havendo justificativa para essa conduta abusiva, imoral e ilegal!

 

Excelência, a Ré XXXX é empresa que atua profissionalmente na comercialização de lotes e terrenos, tendo em seu leque uma vasta opção de lotes, não sendo crível que tenha sofrido tanto prejuízo com um contrato que, após a rescisão, terá o imóvel reintegrado a seu patrimônio, podendo revendê-lo a outro comprador, por preço, inclusive, superior àquele praticado com os Autores.

 

Ora, em outras palavras, é vantajoso para as Rés terem clientes como os Autores, pois, após a rescisão, permanecem com o imóvel, retendo integralmente o montante pago, ou mesmo impondo multas abusivas, obtendo um gigantesco lucro por um contrato que durou apenas poucos meses. Não há outra situação que melhor defina o termo ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA que não a que os Autores têm vivenciado perante as Rés.

 

Note-se, também, que na medida em que não há qualquer previsão de rescisão contratual, poder-se-ia concluir que os Autores devam permanecer indefinidamente vinculado às Rés, o que contraria frontalmente o entendimento do E. TJSP e do C. STJ, como será melhor exposto adiante. 

 

Portanto é certo que se as Rés fossem efetivamente empresas que atuam de acordo

as Leis e os entendimentos pacificados pelas Cortes Superiores, e se houvesse a preocupação e dedicação com os consumidores, não os forçariam a ingressar com demanda judicial para terem seus direitos reconhecidos.

 

Vale dizer, que as Rés não terão nenhum prejuízo no desfazimento do negócio,

tendo em vista que poderão revender a terceiros por um valor igual ou maior do que o fez para os Autores, vez que, devido à crescente valorização imobiliária, apesar da “crise”, as construtoras não têm baixado seus preços.

 

Ou seja, os fatos demonstram uma manobra bem engendrada das Rés, no sentido de dificultar a restituição dos valores pagos e, ainda, uma forma de tentar desesperadamente reter o todos os valores pagos pelos Autores, trazendo a este um ônus excessivo.

 

O contrato é completamente abusivo, gera vantagem exagerada as Rés e afronta o Código de Defesa do Consumidor, resultando no mais completo desequilíbrio contratual, de forma, que só o judiciário pode restabelecer o equilíbrio perdido.

 

Diante do exposto, cumpre esclarecer que a restituição das partes ao Status Quo Ante encontra-se protegida pelo ordenamento jurídico vigente, bem como alinhado pelos precedentes do E. TJ/SP e do próprio STJ, que melhor serão explorados adiante, não havendo justificativa para a absurda postura das Rés, baseada em seu contrato leonino, que lhes proporciona um evidente ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA, este que certamente será combatido pelo Poder Judiciário.

 

Por fim, tendo em vista que os Autores estão em juízo para discutir a RESCISÃO

contratual com a recolocação das partes ao estado anterior à contratação, não há razão para fazer qualquer pagamento adicional às Rés. É uma questão de lógica!

 

Desta feita, é certo que os Autores correm um sério risco de ter os seus nomes NEGATIVADOS, pois existem parcelas vencidas e a vencer.  

 

Por esta razão, para que se impeçam os GRAVES prejuízos que poderão ser causados aos Autores, em razão de eminente INSCRIÇÃO de seus nomes nos órgãos de proteção ao crédito, se faz necessária a intervenção IMEDIATA do Poder Judiciário para que, seja sob o manto da tutela antecipada ou com base no Poder de Cautela deste D. Juízo, seja concedida medida liminar para: SUSPENDER a exigibilidade de TODAS as prestações advindas do contrato entabulado entre as partes referente do lote nº 07, localizado na Quadra CZ, integrante do empreendimento denominado “Ninho Verde II Eco Residence”, inclusive taxas e tributos, especialmente o IPTU advindos dos lotes objeto de rescisão, ao menos até final julgamento da ação, DETERMINANDO, ainda, a rescisão do contrato, podendo as Rés dispor do lote.

 

Assim, resta sobejamente demonstrado o problema a ser solucionado.

 

3. DO DIREITO

 

3.1. DA NECESSÁRIA APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

 

Inicialmente, nota-se que a relação estabelecida entre as partes é governada pelo Código de Defesa do Consumidor nos moldes da Lei nº 8.078/90, senão vejamos:

 

Art. 2º Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. 

§ único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.

 

Art. 3º Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvam atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou de prestação de serviços.

§ 1º Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.

§ 2º Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.

 

Vê-se, portanto, a inequívoca aplicabilidade da legislação consumerista ao caso em tela, pois as Rés vendem e financiam o empreendimento denominado “Riviera de Santa Cristina XIII”, enquanto os Autores são verdadeiros consumidores do produto colocado à disposição no mercado imobiliário.

 

Busca-se ainda a aplicação do princípio constitucional da isonomia previsto no artigo 5º da Constituição Federal buscando a interpretação mais favorável ao consumidor a fim de se ter o equilíbrio contratual.

 

Art. 47 - As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor.

 

Da interpretação dos contratos, tratada no CDC, podemos extrair os seguintes

princípios específicos da interpretação dos contratos:

 

1) a interpretação é sempre mais favorável ao consumidor;

2) deve-se atender mais à intenção das partes do que a literalidade da manifestação de vontade (art. 85, CC);

3) a cláusula geral de boa-fé reputa-se ínsita em toda a relação jurídica de consumo, ainda que não conste expressamente do contrato;

4) nos contratos de adesão as cláusulas ambíguas o contraditórias se fazem em favor do aderente.

 

Com efeito, deve-se ainda observar a regra do artigo 53 do Código de Defesa do Consumidor, que prevê retenção sobre o valor total efetivamente pago, senão vejamos:

 

Art. 53 Nos contratos de compra e venda de móveis e imóveis mediante pagamento em prestações, bem como nas alienações fiduciárias em garantia, consideram-se nulas de pleno direito as cláusulas que estabeleçam a perda total das prestações pagas em benefício do credor, em razão do inadimplemento, pleitear a resolução do contrato e a retomada do produto alienado.

§1º (vetado)

§ 2º Nos contratos do sistema de consórcio de produtos duráveis, a compensação ou a restituição das parcelas quitadas, na fora deste artigo, terá descontada, além da vantagem econômica auferida com a fruição, os prejuízos que o desistente ou inadimplente causar ao grupo. § 3º Os contratos de que trata o caput deste artigo serão expressos em moeda corrente nacional. 

 

Dessa forma, pode-se afirmar que a devolução da quantia paga deve ser em parcela única sob pena de colocar o consumidor em desvantagem, aliás, assunto já sumulado.

 

Súmula nº 02 do STJ: A devolução das quantias pagas em contrato de compromisso de compra e venda de imóvel deve ser feita de uma só vez, não se sujeitando à forma de parcelamento prevista para a aquisição.

  

Ainda nesse sentido, nota-se que referido contrato é caracterizado como contrato de adesão, conforme reza o artigo 54 do Código de Defesa do Consumidor.

 

Art. 54 Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor do produto ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo.

§ 1º A inserção de cláusula no formulário não desfigura a natureza de adesão do contrato. § 2º Nos contratos de adesão admite-se cláusula resolutória, desde que alternativa, cabendo a escolha ao consumidor, ressalvando-se o disposto no § 2º do artigo anterior.

§ 3º Os contratos de adesão escritos serão redigidos em termos claros e com caracteres ostensivos e legíveis de modo a facilitar sua compreensão pelo consumidor.

§ 4º As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão.

 

Assim, resta claro que a relação firmada entre as partes contratantes deve ser regida pelo Código de Defesa do Consumidor.

 

3.2. DA BOA-FÉ OBJETIVA

 

O princípio da boa-fé objetiva versa sobre um conjunto de deveres exigidos nos

negócios jurídicos, mais explicitamente, nos contratos, destinado a pautar a conduta dos contratantes, num silogismo de probidade, honestidade, lealdade e boa-fé.

 

Nas palavras de Ruy Rosado Aguiar Júnior:

 

“a boa-fé se constitui numa fonte autônoma de deveres, independentemente da vontade, e, por isso, a extensão e o conteúdo da relação obrigacional já não se medem somente nela (vontade), e, sim, pelas circunstâncias ou fatos referentes ao contrato, permitindo-se construir objetivamente o regramento do negócio jurídico com a admissão de um dinamismo que escapa ao controle das partes. A boa-fé significa a aceitação da interferência de elementos externos na intimidade da relação obrigacional, com poder limitador da autonomia contratual. O princípio da boa-fé significa que todos devem guardar fidelidade à palavra dada e não frustrar ou abusar da confiança que constitui a base imprescindível das relações humanas, sendo, pois, mister que se proceda tal como se espera que o faça qualquer pessoa que participe honesta e corretamente do tráfego jurídico. (Ruy Rosado Aguiar Junior, Extinção dos contratos por incumprimento do devedor, p. 238)

 

O princípio da boa-fé objetiva pode ser considerado como um elemento a mais na

interpretação dos negócios jurídicos. Havendo divergência sobre o conteúdo das cláusulas contratuais, e havendo necessidade de recorrer-se à interpretação como solução da divergência, a interpretação segundo a boa-fé objetiva terá um papel importante.

 

Dispõe o artigo 422 do Código Civil:

 

Art. 422 Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.

 

Do que do presente já consta, as Rés descumpriram com o seu dever contratual

quando se recusaram a aceitar a rescisão contratual e a devolução de quantia paga pelos Autores.

 

3.3. DA VENDA CASADA, DA CONCRETIZAÇÃO DO GRUPO ECONÔMICO E DA RESPOSABILIDADE SOLIDÁRIA DAS RÉS

 

A “venda casada” consiste em uma imposição feita pelo fornecedor ao consumidor, consubstanciada na exigência de que para adquirir um produto ou contratar um serviço, necessariamente o consumidor deverá adquirir outro, da mesma natureza ou não.

 

Conforme art. 39 e incisos do CDC, a prática abusiva mencionada ocorre onde a

compra e efetiva utilização de um produto ou serviço está condicionada a outra, sem dar ao consumidor a faculdade de obtê-lo ou não. Não nos faltam maneiras para exemplificar como tal prática se dá no cotidiano da sociedade.

 

Assim determina o Código de Defesa do Consumidor:

 

Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:  I - condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos;

 

A proibição do modus operandi praticado pelas Rés não decorre, portanto, de

entendimento doutrinário ou jurisprudencial. Trata-se de vedação expressa da lei.

 

Como mencionado anteriormente, quando da assinatura do contrato de compra e

venda, aos Autores foi imposta a contratação da Ré XXX. Caso os Autores não desejassem a contratação, o negócio não seria concretizado. Não houve nem sequer a possibilitação de pesquisa junto ao mercado financeiro, a opção por outras empresas que oferecessem condições diferentes daquelas IMPOSTAS pelas Rés.

 

Tratava-se, portanto, de verdadeira conditio sine qua non para a concretização do

negócio.

 

Quanto à reprovabilidade da venda casada, eis o entendimento do E. TJSP:

 

Ementa: COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. REPARAÇÃO DE DANOS POR VÍCIOS

CONSTRUTIVOS. TAXA SATI. Ação ajuizada pela adquirente em face das vendedoras pretendendo a reparação dos danos morais decorrentes dos vícios construtivos existentes no imóvel, bem como a restituição dos valores pagos a título de Taxa Sati. Sentença de procedência. Apelo das rés. 1. Autora que não pleiteia a redibição do negócio ou abatimento proporcional do preço, mas sim indenização pelos danos morais decorrentes da diferença entre o projeto e o imóvel entregue. Prevalecem sobre prazos estabelecidos contratualmente os prazos legais de garantia, decadência e prescrição (art. 51, inciso I, do CDC). Aplicação do prazo prescricional decenal do art. 205 do CC para vícios constatados dentro do prazo de 5 anos do art. 618 do mesmo diploma. Aplicação adaptada ao Novo Código Civil da Súmula nº 194 do E. STJ. Precedentes. 2. Imóvel que foi entregue de forma diversa daquele apresentado quando da aquisição. Divergências relevantes entre a publicidade veiculada pelas requeridas e o imóvel construído. Ausência de informação clara e adequada ao consumidor. Colunas ("shafts") nos cantos das paredes e encanamento exposto que causam transtornos e quebra de expectativa que não podem ser considerados mero aborrecimento. Danos morais devidos. Quantum fixado em patamar adequado. Precedentes deste E. TJSP. 3. Taxa cobrada para fins de assessoria na contratação e registro do contrato de financiamento a ser firmado para pagamento do preço. Divergência quanto ao enquadramento da denominada taxa de despachante na expressão "atividade congênere" mencionada no Tema 938 dos recursos repetitivos do E. STJ (REsp 1599511/SP). Ainda que se adote a posição no sentido de que são serviços não embutidos na própria compra do imóvel e passíveis de contratação em separado, o contexto da contratação retira do consumidor a livre escolha e configura venda casada (art. 39, I, do CDC). A contratação do serviço é apresentada no momento da assinatura dos instrumentos que envolvem a compra e venda, em contexto em que a contratação de tal serviço com a própria vendedora, e não com um terceiro, facilitaria todo o procedimento necessário entre a assinatura do compromisso e a efetiva transmissão da propriedade, inclusive no âmbito interno da incorporadora. Vendedora que se aproveita da posição que ocupa e do contexto da assinatura da venda para oferecer serviço que facilita seu negócio e ainda gera receita. Precedentes. Cobrança indevida, devendo os valores pagos serem restituídos. 4. Recurso desprovido.

(TJSP Apelação Cível 1012002-92.2020.8.26.0451. 7ª Câmara de Direito Privado. Rel. Des. Mary Grün. Julgamento em 11/05/2021) (grifamos)

 

Ementa: AÇÃO INDENIZATÓRIA – Contrato de promessa de compra e venda – Ação ajuizada pelos compradores, fundada no inadimplemento da ré – Sentença que a julga parcialmente procedente para condenar a ré ao pagamento do equivalente aos juros de obra desembolsados pela Autora, após a entrega das chaves – Inadimplemento da ré ao entregar o imóvel sem o "habite-se" – Inconformismo da ré. PRAZO DE TOLERÂNCIA – Atraso na entrega da obra, para além do prazo de tolerância de 180 dias previsto no contrato – Entrega das chaves, dentro do prazo, mas sem o "habite-se" – Descumprimento contratual que dá suporte ao ressarcimento dos prejuízos alegados – Entendimento alinhado ao decidido pela Turma Especial de Direito Privado no IRDR nº 0023203-35.2016.8.26.0000 (Tema 1) – Sentença mantida. TAXA DE EVOLUÇÃO DA OBRA – Juros de obra – Admissibilidade – Possibilidade de cobrança de juros compensatórios dentro do prazo de entrega da obra, ou seja, referente a período anterior à entrega das chaves – Tema 4, TJSP, IRDR nº 0023203-35.2016.8.26.0000 – Atraso na conclusão do empreendimento, contudo – Cobrança, no entanto, referente ao período de mora da ré – Autores que fazem, jus, portanto, à devolução do valor pago, desde a entrega das chaves, sem comprovação do "habite-se", ou seja, de agosto de 2016 a julho de 2018 – Sentença reformada para esse fim. DANO MORAL – Configuração – A demora injustificada na entrega do imóvel, com o agravante de inúmeros defeitos construtivos, causa dano moral, dada a frustração e angústia imposta ao comprador na espera pela ocupação e fruição do bem adquirido – Indenização devida – Finalidade – Reparação do sofrimento da vítima e, ao mesmo tempo, desestimular a prática do fato, pelo ofensor – INDENIZAÇÃO – Valor – Arbitramento que deve se dar com observância dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, evitando o enriquecimento sem causa do ofendido, ou provocando injusto desfalque do patrimônio do ofensor – Arbitramento em R$ 15.000,00 – Valor que atende aos critérios mencionados – Juros a partir da citação e correção monetária a contar deste julgamento – Sentença reformada. TAXA SERVIÇO DE DESPACHANTE – Taxa de administração e SATI, dita pela vendedora de serviço de despachante – Pretensão dos compradores à restituição de valores pagos a esse título – Aditivo contratual para prestação de serviços assinados pelo comprador, para auxílio na obtenção de documentação necessária ao financiamento – Contrato que estipula claramente os serviços oferecidos, o preço e a forma de pagamento – Imposição, no entanto, de que, convocada os compradores para, em trinta dias, comparecer e fornecer os documentos necessários, caso contrário podendo o contrato ser rescindido – Contratação não ofertada, mas imposta de forma onerosa, vinculada ao contrato de compra e venda, a configurar verdadeira venda casada, assemelhada à chamada taxa SATI, disfarçada de taxa de despachante – Cobrança indevida – Entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso repetitivo – Sentença que determina a restituição dessas taxas, mantida. Apelação da ré não provida, provida a da Autora, para julgar a ação totalmente procedente.

(TJSP Apelação Cível 1008954-68.2017.8.26.0019. 10ª Câmara de Direito Privado. Rel. Des. João Carlos Saletti. Julgamento em 30/04/2021) (grifamos)

 

SEGURO – Tese firmada no julgamento do REsp 1.639.259/SP, sob o rito dos recursos repetitivos, que sedimentou o entendimento de que "Nos contratos bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada" – Imposição, ao consumidor, de contratação de seguro com seguradora indicada pela instituição financeira fornecedora do crédito objeto do financiamento – Hipótese de venda casada – Abusividade configurada

(TJSP Apelação Cível 1000082-35.2016.8.26.0040. 24ª Câmara de Direito Privado. Rel. Des. Plinio Novaes de Andrade Junior. Julgamento em 18/06/2021) (grifamos)

 

Portanto, resta demonstrada a ocorrência de venda casada pelas Rés, pois aos Autores não foi aberta a possibilidade de escolha sobre com qual instituição financeira proceder a eventual financiamento.

 

Logo se vê que as empresas Rés são pertencentes a um mesmo grupo econômico e, por isso, devem responder solidariamente aos termos da demanda. Ora, se no momento da venda, a única opção aos Autores consumidores para contratação do financiamento é a Ré XXX, logo, pela teoria da aparência, ambas as Rés pertencem a um grupo econômico, onde uma oferece os imóveis à venda e outra realiza o financiamento. 

 

Tão facilitadas são as condições de contratação que, repita-se, para um contrato de tão elevado valor, nenhum documento para a análise e aprovação de crédito foi exigida dos Autores, bastando tão somente as declarações contratuais e a assinatura dos contratantes.

 

Nas lições de Victor Frederico Kümpel:

 

“a aparência outorgou legitimidade a uma pessoa, conferindo-lhe direitos, com relevância econômica, pela absoluta impossibilidade de cognição da realidade jurídica que o levou a realizar o negócio jurídico. A aparência não incide e não poderia incidir sobre a avaliação substancial dos interesses em jogo. É apenas um instrumento a serviço de uma das partes na relação jurídica, para proteger até a segurança do sistema jurídico. [...] Conforme está sendo mostrada, a teoria da aparência jurídica é um instrumento hábil para proteger os terceiros de boa-fé, evitando insegurança jurídica em negócios que, objetiva e subjetivamente, crêem ser suportes jurídicos aptos a produzir efeitos permanentes. Ante a publicidade gerada e a confiança legítima, imputadas na relação, é que o sistema jurídico convalida uma relação originária nula ou até inexistente para fins de proteção desse terceiro de boa-fé” (KÜMPEL, Vitor Frederico. Teoria da aparência no Código Civil de 2002. São Paulo: Método, 2007, p. 58-59) (grifamos)

 

A adoção da teoria da aparência nada mais é que um desdobramento da aplicação do princípio geral da boa-fé objetiva. Afinal, privilegia-se a aparência em detrimento da realidade, com a finalidade de preservar o terceiro de boa-fé. 

 

Segundo o ensina Judith Martins-Costa: 

 

agir segundo a boa-fé objetiva concretiza as exigências de probidade, correção e comportamento leal hábeis a viabilizar um adequado tráfico negocial, consideradas a finalidade e a utilidade do negócio em vista do qual se vinculam, vincularam, ou cogitaram vincular-se, bem como o específico campo de atuação em que situada a relação obrigacional.” (MARTINS-COSTA, Judith.

A boa-fé no direito privado: critérios para sua aplicação. 2ª ed., São Paulo: Saraiva Educação, 2018, p. 43) (grifamos)

 

Nessa senda, não se afigurava razoável exigir que os Autores duvidassem da lisura do procedimento adotado, tendo por base os elementos fáticos descritos, à luz das teorias da confiança e da aparência, que legitimaram comportamento concludente e justa expectativa correlata. 

 

Ainda que não se reconheça a responsabilidade solidária pela formação do grupo

econômico diante da teoria da aparência, é fato incontestável que ambas as empresas integram a cadeia de fornecimento, e, também por tal motivo, devem responder solidariamente quanto aos termos da presente demanda, nos termos do artigo 7º, parágrafo único do CDC, pelo qual “Tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo.”

 

3.4. DA INEXISTENCIA DE CLÁUSULA RESOLUTÓRIA – EVIDENTE OFENSA AO ARTIGO 26-A, INCISO V DA LEI 6.766/79

 

O inciso V, do art. 26-A da Lei 6.766/79 dispõe que não apenas os contratos de compromisso ou promessa de compra e venda, mas também os contratos de compra e venda de lotes devem conter regras que disciplinem “as consequências do desfazimento do contrato”, ou seja, devem ter, obrigatoriamente uma cláusula resolutória:

 

Art. 26-A. Os contratos de compra e venda, cessão ou promessa de cessão de loteamento devem ser iniciados por quadro-resumo, que deverá conter, além das indicações constantes do art. 26 desta Lei: (Incluído pela Lei nº 13.786, de 2018)

(...)

V - as consequências do desfazimento do contrato, seja mediante distrato, seja por meio de resolução contratual motivada por inadimplemento de obrigação do adquirente ou do loteador, com destaque negritado para as penalidades aplicáveis e para os prazos para devolução de valores ao adquirente; (Incluído pela Lei nº 13.786, de 2018)

 

A necessidade de cláusula resolutória com as penalidades aplicáveis é tão imperiosa que o §1° do mesmo artigo dispõe que se a ausência destas regras não for sanada “caracterizará justa causa para rescisão contratual por parte do adquirente”.

 

Deste modo, observa-se que a Ré XXXX descumpriu o mandamento previsto no inciso V do art. 26-A da Lei 6.766/79, ao deixar de incluir cláusula resolutória e as penalidades decorrentes da rescisão no Contrato Particular de Compromisso de Compra e Venda.

 

Cumpre ainda destacar que, conforme se verá adiante, não se trata de contrato

definitivo de compra e venda, mas de compromisso de compra e venda, já que se trata de contrato particular e a legislação civil expressamente dispõe que o contrato definitivo de compra e venda de imóveis de valor superior a trinta salários-mínimos, para que tenha validade, deve ser feito por escritura pública (art. 108 e art. 104, III do Código Civil).

 

3.5.      DO CONTRATO DE COMPROMISSO EM OPOSIÇÃO AO CONTRATO DEFINITIVO

 

Faz-se necessário destacar que o Contrato celebrado entre as partes NÃO é um

contrato definitivo de compra e venda, mas sim um contrato particular de promessa ou compromisso de compra e venda.

 

Trata-se de contrato particular preliminar e não escritura pública definitiva, fato que, por si só, afasta a tese das Rés de que o contrato celebrado tem caráter definitivo. 

 

Neste sentido o artigo 108 do Código Civil é claro ao dispor que, a validade dos negócios jurídicos de venda de imóveis de valor superior a 30 salários mínimos depende da formalização do negócio por meio de escritura pública:

 

Art. 108: Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário-mínimo vigente no País.

 

Portanto, tendo o lote valor superior a 30 vezes o salário-mínimo vigente no país,

tem-se que o contrato particular de compra e venda juntado a presente, se trata na verdade de um contrato de promessa ou de compromisso de compra e venda e não de um contrato definitivo.

 

Ademais, a própria Lei estabelece de forma clara as duas ÚNICAS situações em que um contrato particular se torna definitivo, e são elas: 

 

1)  Aquisição de imóvel pelo SFH com garantia de hipoteca nos termos do art.

61, §5° da Lei 4.380/64.

2)  Aquisição de imóvel com alienação fiduciária de bem imóvel nos termos do art. 38 da Lei 9.514/97.

 

Deste modo, uma vez não verificadas as situações acima descritas, não resta dúvida alguma de que o contrato firmado entre as partes não é um contrato definitivo, sendo passível de rescisão contratual.

 

3.6. DO DIREITO LÍQUIDO E CERTO A RESCISÃO CONTRATUAL COM A DEVIDA RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS  

 

Conforme aduzido, os Autores tentaram uma composição amigável com as Rés antes de provocar o Judiciário, a fim de receber os valores desembolsados em razão da rescisão do Contrato de Compra e Venda, todavia, tais tentativas restaram frustradas.

 

Não obstante, ressalta-se que os pleitos dos Autores estão totalmente agasalhados pela legislação, inclusive com pronunciamento dos Tribunais em casos análogos, senão vejamos:

 

Compromisso de venda e compra. Dissolução do contrato por iniciativa da adquirente. Circunstância que não impede a devolução das parcelas pagas, sob pena de ofensa ao art. 53 do CDC. Retenção corretamente autorizada em 20% dos valores pagos. Juros de mora que devem mesmo incidir desde o trânsito em julgado. Sentença mantida. Recurso desprovido. 

(TJSP;  Apelação Cível 1006906-73.2019.8.26.0664; Relator (a): Claudio Godoy; Órgão Julgador: 1ª Câmara de Direito Privado; Foro de Votuporanga - 2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 03/02/2020; Data de Registro: 03/02/2020). Grifo próprio.

 

APELAÇÃO - COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA – RESOLUÇÃO MOTIVADA PELO ADQUIRENTE – DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS, COM RETENÇÃO – PARCIAL PROCEDÊNCIA – INCONFORMISMO DA RÉ – ACOLHIMENTO EM PARTE – Abusividade da cláusula contratual que prevê descontos excessivos para o caso de rescisão contratual por culpa do adquirente - Caso concreto que demonstra ser razoável a retenção no percentual de 20% dos valores pagos a título de indenização pelas despesas geradas, segundo entendimento do STJ e precedentes desta C. Câmara – Taxa de ocupação - Inadmissibilidade – Incabível indenização quando se trata de lote de terreno sem edificação - DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO.  (TJSP;  Apelação Cível 1000365-12.2019.8.26.0474; Relator (a): Alexandre Coelho; Órgão Julgador: 8ª Câmara de Direito Privado; Foro de Potirendaba - Vara Única; Data do Julgamento: 31/01/2020; Data de Registro: 31/01/2020). Grifo próprio.

 

Sendo assim, é certo que as Súmulas 1, 2 e 3 do E. TJ/SP permitem ao promissário-

comprador, mesmo inadimplente, RESCINDIR o compromisso de venda e compra e receber de volta parte das quantias quitadas ao comprador; senão vejamos:

 

Súmula 1: O Compromissário comprador de imóvel, mesmo inadimplente, pode pedir a rescisão do contrato e reaver as quantias pagas, admitida a compensação com gastos próprios de administração e propaganda feitos pelo compromissário vendedor, assim como com o valor que se arbitrar pelo tempo de ocupação do bem.

 

Súmula 2: A devolução das quantias pagas em contrato de compromisso de compra e venda de imóvel deve ser feita de uma só vez, não se sujeitando à forma de parcelamento prevista para a aquisição.

 

Súmula 3: Reconhecido que o compromissário comprador tem direito à devolução das parcelas pagas por conta do preço, as partes deverão ser repostas ao estado anterior, independentemente de reconvenção.

 

Como se pode observar, nos termos da SÚMULA 1 do TJ/SP, o promissário

comprador, mesmo inadimplente, poderá requerer a rescisão da promessa de compra e venda, admitindo-se a retenção de valores apenas para compensar os gastos administrativos e de publicidade da Loteadora.

 

O direito do promissário comprador de rescindir a promessa de compra e venda

também fora reconhecido pela SÚMULA 543 DO STJ, que dispõe que o comprador tem direito a imediata restituição das parcelas pagas, ainda que ele tenha dado causa à rescisão:

 

Súmula 543 - Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador -integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento. 

(Súmula 543, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 26/08/2015, DJe 31/08/2015)

 

Portanto, repita-se, mesmo nos casos em que o adquirente esteja inadimplente, este fará jus à rescisão do contrato, devendo as partes serem repostas ao status anterior à celebração do contrato.

 

Considerando a conduta perpetrada pelas Rés, os Autores PRETENDEM ser repostos ao estado em que estavam antes da celebração da avença em discussão (restabelecimento da parte ao STATUS QUO ANTE), mediante a restituição de 80% das quantias pagas por esta aquisição até o último centavo destinado às Rés.

 

Isso significa dizer que os valores quitados pelos compromissários compradores deverão ser restituídos, À VISTA, devidamente atualizados desde cada desembolso e acrescido dos respectivos juros de mora, e tudo pago em uma única parcela.

 

Desta forma, de rigor o decreto judicial de rescisão do “Contrato de Compra e Venda”, referente a aquisição do lote nº 07, localizado na Quadra CZ, integrante do empreendimento denominado “Ninho Verde II Eco Residence”, com a consequente condenação das Rés na restituição de 80% dos valores pagos pelos Autores, a título de parcelas contratuais e entrada, a ser corrigido monetariamente a partir do desembolso de cada pagamento, além da incidência de juros legais de 1% (um por cento) ao mês a partir do transito em julgado da ação, até a data do efetivo pagamento.

 

4.    DA CONCESSÃO DE TUTELA DE URGÊNCIA – Art. 300 e ss, do CPC

 

4.1. DA NECESSÁRIA ABSTENÇÃO DE INCLUSÃO DO NOME DOS AUTORES NOS CADASTROS DE RESTRIÇÕES AO CRÉDITO E DA SUSPENSÃO E INEXIGIBILIDADE DE VALORES RELATIVOS À COMPRA E VENDA DO IMÓVEL OBJETO DA RESCISÃO

 

Uma vez que os Autores optaram por rescindir o contrato e estão em juízo para discutir o valor a receber, é evidente que NÃO justifica a realização de qualquer pagamento adicional às Rés.

 

O grande problema e o maior medo dos Autores é o risco que corre de terem seus nomes negativados, uma vez que, há parcelas a vencer, em razão de não ter mais condições de cumprir com suas obrigações e manter o negócio jurídico pactuado.

 

Em razão disso, é certo que as Rés podem taxar os Autores de INADIMPLENTES e passar a realizar a cobrança do saldo devedor, inserindo, inclusive o nome dos Autores nos cadastros de restrições ao crédito.

 

Ora Excelência, por uma questão de lógica, se os Autores estão em juízo para que seja declarada a RESCISÃO DO CONTRATO e determinada a DEVOLUÇÃO dos valores já pagos, nenhum pagamento adicional deverá ou poderá ser realizado as Rés, pois isso não faria o menor sentido.

 

No entanto, os Autores não podem ficar sujeitos ao alvedrio das Rés que, a julgar pelos comportamentos pretéritos, poderão negativar o nome dos Autores, o que seria um verdadeiro absurdo, pois as Rés se negaram a realizar o distrato do contrato pactuado, de forma justa, e restituir os valores devidamente quitados de forma condizente!!

 

Desta forma, agora, os Autores necessitam de um provimento jurisdicional para impedir que seja vitimado de coação moral que certamente irá acontecer, nos termos do art. 300 e seguintes, do CPC, vejamos:

 

Art. 300 - A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

§1º - Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la. §2º - A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia. §3º - A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.

 

Desta forma, requerem os Autores a este D. Juízo que seja concedida medida liminar para SUSPENDER a exigibilidade de TODAS as prestações advindas do contrato entabulado entre as partes referente ao lote nº 07, localizado na Quadra CZ, integrante do empreendimento denominado “Ninho Verde II Eco Residence”, DETERMINANDO que as Rés se abstenham de negativar os nomes dos Autores nos órgãos de proteção ao crédito, ao menos até final julgamento da ação, DECLARANDO, ainda, a prévia rescisão do contrato, podendo as Rés disporem do Lote, sem a oitiva da parte contrária, ao menos até final julgamento da ação.

 

5. DOS PEDIDOS

 

Diante de todo o exposto, requerem os Autores que se digne Vossa Excelência:

 

1.                  Seja imediatamente concedida a TUTELA DE URGÊNCIA, sem a oitiva da parte contrária, para que, seja sob o manto da tutela antecipada, à luz do artigo 300 e ss, do CPC, sejam determinadas as seguintes providências às Rés:

 

     SUSPENDAM A EXIGIBILIDADE DOS VALORES DO CONTRATO, INCLUSIVE DAS DEMAIS DESPESAS ADVINDAS DO LOTE E DO IPTU, determinado que as Rés arquem com o pagamento de todas as despesas, haja vista a rescisão contratual que se pretende, sob pena de multa diária a ser prudentemente arbitrada por este D. Juízo;

 

     Determine as Rés que SE ABSTENHAM DE NEGATIVAR O NOME DOS AUTORES perante os órgãos de proteção ao crédito, em razão do não pagamento das parcelas contratuais advindas do lote sob pena de pagamento de multa diária no valor a ser arbitrado por este Juízo;

 

     Seja declarada a rescisão do contrato, podendo as Rés disporem do imóvel desde o conhecimento da decisão que deferiu a tutela.

 

2.                  Informam os Autores não terem interesse na designação da Audiência de Conciliação ou Mediação, conforme previsto no art. 319, do CPC;

 

3.                  Requer a juntada das inclusas guias de custas devidamente recolhidas;

 

4.                  Requer a citação das Rés nos endereços declinados na presente, POR CARTA DIGITAL UNIPAGINADA, conforme comunicados CG 165/2014 e SPI 306/2013, para, querendo, oferecer defesa, sob pena dos efeitos da revelia, e, ao final, seja a presente demanda julgada TOTALMENTE PROCEDENTE a presente demanda para;

 

a.             Reconhecer a responsabilidade solidária das Rés, nos termos expostos;

 

b.             Confirmar por sentença a liminar ora pleiteada para o fim de declarar a inexigibilidade das parcelas do contrato e impossibilidade de negativação do nome dos Autores, bem como para que assuma todas as despesas com o imóvel, além da rescisão contratual;

 

c.              Que seja determinada a inversão do ônus da prova nos termos do artigo 6º, inciso

VIII da Lei 8.078/90, a fim de que os Autores tenham facilitadas a defesa de seus direitos;

 

d.             Requer sejam as Rés condenadas a restituir aos Autores, em parcela única, o equivalente a 80% (oitenta por cento) dos valores desembolsados por ele a título de entrada e parcelas do terreno, que serão devidamente apurados em fase de liquidação de sentença, devidamente corrigidos desde cada desembolso e acrescidos de juros legais desde o trânsito em julgado até o efetivo pagamento, com a consequente declaração de rescisão do Contrato de Promessa de Compra e Venda firmado para aquisição do lote nº 07, localizado na Quadra CZ, integrante do empreendimento denominado “Ninho Verde II Eco Residence”, direito assegurado não apenas pelo CDC, mas também pelas súmulas 1, 2 e 3 do E. TJSP e 543 do STJ;

 

e.              Condenar as Rés ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios a serem arbitrados por este d. juízo, bem como, pelo PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE, deve ser aplicada às Rés a sucumbência tendo em vista que se negaram a realizar o distrato do contrato de forma condizente com a legislação, não havendo outra forma dos Autores fazê-lo senão com a propositura da presente.

 

Por fim, protesta provar o alegado, por todos os meios de direito admitidos em

especial, prova documental e depoimento da requerida.

 

Atribui-se à causa o valor de R$ 29.219,95 (vinte e nove mil e duzentos e dezenove reais e noventa e cinco centavos), correspondente à cominação máxima prevista no item “d” acima, em consonância com o artigo 292, II, do Código de Processo Civil, que alterou a legislação anterior para atribuir às causas que versem sobre a rescisão contratual, o valor do BENEFÍCIO ECONÔMICO almejado na demanda.

 

Art. 292. O valor da causa constará da petição inicial ou da reconvenção e será: II - na ação que tiver por objeto a existência, a validade, o cumprimento, a modificação, a resolução, a resilição ou a rescisão de ato jurídico, o valor do ato ou o de sua parte controvertida; 

 

Tal alteração vem em consonância com a orientação jurisprudencial do nosso Tribunal, senão vejamos:

 

Ementa: Agravo de Instrumento. Valor da causa. Autores que pretendem obter a restituição de percentual dos valores pagos em razão do compromisso de compra e venda rescindendo. Juízo que determinou a alteração do valor da causa, para equivaler ao valor do contrato. Aplicação do art. 292, II, do CPC. Valor da causa que deverá ser atribuído de acordo com o benefício patrimonial pretendido, o que se coaduna, neste caso, com a melhor interpretação do comando legal no sentido de que deve corresponder ao valor "de sua parte controvertida". Agravo provido.

(Agravo de Instrumento 2055999-74.2018.8.26.0000. 7ª Câmara de Direito Privado. Relatora

Desembargadora MARIA DE LOURDES LOPEZ GIL. Julgamento em 26/11/2018) (grifamos)

 

Ementa: Agravo de instrumento – Ação de rescisão de compromisso de compra e venda c.c. restituição de valores – Insurgência em relação as decisões que corrigiram o valor atribuído à causa, (para o valor do contrato a ser rescindido) Valor atribuído à causa que, no caso de rescisão promovida pelos compradores, deve corresponder ao valor do ressarcimento pretendido, já que é o proveito econômico perseguido – Quantia que reflete a expressão econômica da causa - Previsão expressa no art. 292, II do CPC – Precedentes jurisprudenciais, inclusive desta Câmara - Decisão modificada para se manter o valor originalmente atribuído à causa – Recurso provido. (Agravo de Instrumento 2217010-15.2018.8.26.0000. 8ª Câmara de Direito Privado. Relator Desembargador SILVÉRIO DA SILVA. Julgamento em 21/11/2018) (grifamos).

 

Por fim, requerem que todas as intimações sejam realizadas em nome da advogada Dra. XXXX XXXX XXXX, inscrito na OAB/SP sob nº XXX.XXX, telefone de contato XX XXXXX-XXXX, com endereço eletrônico XXXXXXXXXXX, sob pena de nulidade, nos termos legais.

 

 

Nestes Termos

Pede Deferimento.

 

São Paulo, XX de XXXXX de 20XX.

 

 

Dra. XXXXX XXXXXX

(OAB/SP) sob o nº. XXX.XXX

 

 

 

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